Chromatics (2017)
Colocou o celular na jaqueta, apertou o botão vermelho e
sentiu a vibração indicando que por fim, desligou. Noite fria de um junho, oito
da noite de uma quarta-feira, 2005. A jaqueta incomodava um pouco, mas era o
que tinha para a ocasião, se sentiu seguro por não ser o único no ponto
esperando o ônibus.
No caminho, durante todas as voltas pelo centro paulistano,
ficou pensando em qual desculpa daria pelo atraso, “trânsito, você sabe” “mas
você nem ao menos possui carro”, “fiquei até tarde no trabalho” “nós estávamos
no escritório, vimos você saindo cedo”, “estava com a Paula” “vocês não
terminaram?”, balançou a cabeça desistindo da ideia. Era só um evento da
agência, apenas aparecer, dizer oi e sair. Simples.
Todos sorridentes, uma entrada calada, no meio de algumas
pessoas barulhentas. Pegou um copo de cerveja e se dirigiu aos colegas do
dia-a-dia, ninguém perguntou sobre o atraso, “eu sabia que ninguém daria à
mínima”. Não bebeu nada, lembrou-se do
que Sofia disse na última sessão. Em um
grupo de cinco pessoas, havia um que não parava de beber, outro que só ficou na
sacada fumando, um que só comeu doces, a garota que não parava de falar do
trabalho e claro, ele, ali, olhando para o nada e segurando um copo de cerveja
quente.
Palmas, diretor agradecendo pelo fantástico ano, blá, passou
pelo entusiasmo momento, desceu as escadas e já estava no centro antigo. Colocou
as mãos no bolso da jaqueta, entrou na minúscula porta. Dentro de um quarto,
luz baixa, apenas esperava. “De novo?” “eu preciso”. Em um momento pensaria em todo o ambiente
sórdido, a poeira atravessando a luz vermelha, o barulho dos quartos ao lado, o
cheiro de látex, o corpo esculpido em sua frente parecia destoar de tudo ao
redor. Os cabelos negros, o olhar fixo,
o abdômen duro, os pelos indicando a idade, 20 anos ou menos.
Era a quarta vez em menos de uma semana, após ali, iria para
outro lugar parecido, deitar-se com outro abdômen, e logo após, um lugar onde
todos deitariam juntos. Não cruzava o olhar com nenhum estranho na rua, não
havia visto nenhum conhecido por dias, não manteve nenhuma conversa sobre o
tempo, mas era ali, no meio do suor, do cheiro de outras pessoas que mal sabia
reconheceria seus rostos, que sentia uma
ponta de vida. Até chegar o dia seguinte.
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